Na aritmética básica do cinema, imagem + som = significado. Simples, mas é aí que reside o maior desafio dessa arte: construir sentido, dispor os fotogramas em uma sucessão lógica ao mesmo tempo em que se revela uma visão de mundo.
A mutação do cinema de David Cronenberg
Mapas Para as Estrelas, trabalho mais recente de David Cronenberg, estreou há poucas semanas no Brasil. E, assim como em Cosmópolis, de 2012, me peguei esperando ver algo que remetesse ao passado do diretor, aqueles filmes pesados de horror gráfico. Quando saí da sessão, a ficha caiu: aquele cineasta não existe mais. Assim como o homem sofria mutações em suas obras dos anos 1980 e 90, a filmografia do canadense também se metamorfoseou a partir da virada do século.
O Mensageiro do Diabo (1955), de Charles Laughton
Já que no último texto comentei sobre filmes que tratam a infância como ela realmente é – um período rico, complexo e difícil da vida -, decidi permanecer no tema ao lembrar de um clássico esquecido. O ator inglês Charles Laughton já era consagrado quando, sem experiência alguma em direção, fez uma das mais sombrias fábulas infantis do cinema: O Mensageiro do Diabo.
A infância como ela é
Um dos momentos mais ricos da vida é a infância. No entanto, ser criança só parece fácil. Claro que existe a facilidade de não possuir grandes responsabilidades, mas o choque entre a inocência e a aspereza do mundo sempre está lá para confundir a cabeça. Vendo O Garoto da Bicicleta, dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne, me recordei de vários momentos especiais nos quais o cinema conseguiu captar, de forma séria, o espírito errante infantil. Criança não é burra ou alienada, como bem provam Truffaut e Kiarostami, por exemplo.
Tempestade Sobre Washington (1962), de Otto Preminger
“Esta é Washington D.C., cidade da mentira. Os outros sabem que você está mentindo, e também sabem que você sabe que eles sabem”. A frase do protagonista de Tempestade Sobre Washington, o senador indicado a Secretário de Estado americano vivido por Henry Fonda, resume o espírito dessa obra-prima política. Otto Preminger fez um retrato ao mesmo tempo sisudo, sarcástico e desencantado sobre a vida pública dos Estados Unidos – mas com um quê de universal, afinal, política é política em qualquer lugar do mundo.