Cada um tem o mestre que merece

30 de julho. Dia de gênios únicos, porque insubstituíveis, irem embora. Foi assim em 2007, quando, de uma única vez, perdemos Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni (embora, admito, seu cinema não me comova como eu mesmo gostaria). E, agora, em 2012, a trágica data se repete: desta vez, morreu Chris Marker.

Na maioria das vezes, parece que somente com fatos agudos desse porte se torna possível dimensionar a importância de certos personagens. O ser humano é um tanto quanto mórbido nesse sentido. Marker é um dos nomes fundamentais do documentário: ajudou a reformular o gênero – se é que pode ser chamado assim -, inserindo doses de ficção na realidade crua que costumava filmar. Só nos 28 minutos de La Jetée – esse, sim, pura ficção -, seu mais conhecido trabalho, lançado em 1962, fez mais por sua arte do que uns 60% dos diretores ao longo da história – e, detalhe, somente usando fotos, imagens paradas. Subverteu o princípio básico do cinema, o movimento.

E, ainda assim, é lembrado como simples “documentarista francês” nas notas a respeito de sua morte. Enquanto isso, realizadores atuais apoiados pela grande máquina do marketing, essencial nos tempos modernos, parecem já garantir seus lugares como novos deuses a guiarem seus rebanhos – no caso, as multidões a se acotovelarem nos multiplexes de shopping centers. Christopher Nolan é um desses. Melhor roteirista do que cinegrafista – e, ainda assim, quase que inevitavelmente, seus argumentos acabam pecando em algum momento -, cria interessantes ideias no papel, mas razoáveis, ou até mesmo fracas, onde mais importa: na tela.

Batman Begins possui uma ótima primeira hora, embora sua parte final seja apressada, descartando personagens de forma inexplicável. O Cavaleiro das Trevas impressiona à primeira vista; contudo, diminui a cada revisão: há coisas demais acontecendo ao mesmo tempo; as sequências de ação são filmadas sem coerência alguma – nunca sabemos se X está perto de Y, se K se move na mesma direção de J etc. -; a dramatização, com exceção das cenas do Coringa de Heath Ledger, a força motriz do longa, é forçada. A Origem seria melhor se fosse um quadrinho ou jogo de videogame; muita falação, muita explicação para quase nada de imagem que valha a pena. Ainda não vi o novo Batman, mas não espero grandes melhorias: cinema não se faz apenas com construção de personagem, referências à cultura pop, roteiros labirínticos, piscadelas para o espectador. Com tudo isso, apesar de todas as notáveis limitações de Nolan, ai de quem falar mal – ou melhor, ver o óbvio – sobre seu trabalho.

Nesses momentos de histeria popular, então, resta-nos honrar o legado daquele que não é apenas um “documentarista francês”. Cada um tem o mestre que merece.

La Jetée (1962) na íntegra, em três partes

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